Descobri Octavia Buttler através de Karina Vieira. Karina tem sido minha mentora a muitos anos, desde quando deixei os meus cabelos naturais com o apoio dela e do coletivo meninas Black Power. Passei a acompanhar seus textos e suas dicas de leitura.
Não tenho intimidade com a leitura Afrofuturista e acho que demorei tempo demais pra desbravar esse mundo. A pulga da curiosidade ficou atrás da minha orelha porque se Karina indica eu tenho que tomar vergonha na cara e obedecer.
Laços de sangue é um livro se passa nos Estados Unidos. Uma mulher negra retinta e jovem que se encontra em um relacionamento estável é transportada da década de 70 para o período da escravidão mediante a um determinado evento. Não vou falar como pra não dar Spoiler.
Uma vez no período da escravidão com a experiência dos dias atuais ela entra em conflitos com os escravizados e com os brancos. Me deu vários bugs na mente porque muitas vezes eu vejo situações ocorrerem com a população negra e eu culpava a nós mesmos. Ao me dar conta do formato estrutural que nos mantem refém até os dias de hoje, desse sistema racista, percebo que nem tudo é tão fácil assim, fogo nos racistas? Beleza. Experimente queimar uma pessoa branca declaradamente racista...
Temos que ampliar nossas estratégias de enfrentamento. O livro expõe a miscigenação através do estupro, expõe com muita clareza a maldade do homem branco escravocrata que nos mantem em um sítio de terror a violência, tudo com as bênçãos cristã e com o aval da legalidade (que seria o estado nos dias atuais). Como diz Achille Mbembe a raça é utilizada como tecnologia de poder. No livro fica bem elucidado quem apanha e quem bate.
Os escravizados são inteligentes, estratégicos, são críticos, tem fé, tem noção de família, amor pelo próximo, lealdade, amor pelos filhos e cada ponto desse é atacado pelos brancos para a desestruturação do grupo. Se apaixonou? Um dos pares é vendido. Teve filhos? Os mesmos são vendidos para que a maternidade e paternidade não seja desempenhada. Aprendeu a ler? Leva Chicotadas. O senhor não quer mais como escrava sexual após inúmeros estupros? Coloca para trabalhar no campo.
É muito bem descrito o poder vil da mulher branca sobre os corpos negros e seu ódio a mulher negra principalmente a que ela acha que é mais inteligente que ela.
A violência física como forma de espetáculo para “dar lição” aos demais escravizados, o processo de escravidão naturalizado e as crianças reproduzindo em forma de brincadeiras porque esse é o universo que eles conhecem.
O perdão, a resiliência são os pontos fortes do livro, haja resiliência...
Os personagens são bem descritos, os seus traços, seus sentimentos, os gostos, profissão, talento, tom de cor da pele, suas reações, amarguras, ressentimentos, sonhos... aprendi a prestar atenção nisso com Conceição Evaristo.
Fala de estereótipos, cita lutas negras, privilégio branco.
A escravidão foi/é uma grande assassina, de corpos, de sonhos de futuros de mentes. Não podemos de forma alguma deixar de falar sobre dar detalhes pois só assim construiremos um arcabouço para nos proteger.
O livro é muito fantástico. Ao mesmo tempo que causa indignação, da pra ler sem adoecer. Amei a escrita de nossa ancestral Octavia.
Octavia Estelle Butler ( 1947 — 2006), mais conhecida por Octavia Butler, foi uma escritora afro-americana consagrada por seus livros de ficção científica feminista e por inserir a questão do preconceito e do racismo em suas histórias.
Octavia Butler decidiu tornar-se escritora aos doze anos ao assistir o filme Devil Girl from Mars e convencendo-se de que poderia escrever uma história melhor. Depois de vender algumas histórias para antologias, adquiriu notoriedade a partir dos anos 1980, ganhando os prêmios Nebula e Hugo. Mas foi a publicação dos livros Parable of the Sower (1993) e Parable of the Talents (1998) que solidificou sua fama como escritora. Em 2005, ela foi admitida no Hall Internacional da Fama de Escritores Negros.
Após sua morte, em 2006, uma bolsa de estudos que leva seu nome foi criada para incentivar estudantes negros inscritos nas oficinas de escrita onde Butler foi aluna e, mais tarde, professora. (fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Octavia_Butler).
Nenhum comentário:
Postar um comentário