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16 abril 2020

COVID 19 e a população negra

Foto de @nicolasalsur
Dei uma pausa nas leituras para refletir sobre o corona vírus e a população negra.

Antes de mais nada é necessário dizer que vivemos em um mundo onde a desigualdade social tem cor, a pobreza tem cor, a vulnerabilidade tem cor. 

E em tempos de COVID 19 como fica?

Com o proposito de esclarecimento vou resumir o que seria COVID-19: Trata-se de doença causada pelo corona vírus SARS-CoV-2.  A transmissão acontece de uma pessoa doente para outra por contato, por meio de toque, saliva, espirro, tosse; objetos ou superfícies contaminadas. Diante disso quem se contamina pode ficar assintomático ou chegar a quadros respiratórios que atingem tamanha gravidade que possa precisar de internação em UTI (Unidade de terapia intensiva) e usar um aparelho de suporte ventilatório.

Desde que as mídias sociais se tornaram mais democráticas o acesso a informações ocorre de forma veloz. Representantes da comunidade negra manifestaram-se rapidamente ao tomarem conhecimento da doença visto que, é de fácil transmissão, ainda não possui vacina ou cura, leva a estado grave de saude, tem consequência maior aqueles que já são portadores de alguma patologia, necessita de atenção médica especializada.

Uma vez que o racismo faz parte da construção social e está presente em todos os espaços, nesse momento ele reedita e se manifesta.   A china adotou uma prática que não faz parte das orientações da Organização Mundial de Saúde (OMS). Pessoas negras estavam sendo impedida de ser atendidas em restaurantes como medida de “prevenção” ao COVID19, a rede de hotelaria com a mesma linha de pensamento estava despejando os hóspedes de origem Africana e não aceitando check in de quem tinha reserva. Os que tem suas residências são proibidos de ir à rua para comprar água e comida, tratamento diferente dado aos cidadãos chineses.  Despejados, muitos estão nas ruas com seus  pertences pessoais dormindo em baixo da ponte e se sujeitando a contaminação.

Na Europa um dos diretores do hospital Cochin de Paris, e Camille Locht, diretor do INSERM afirmaram ao vivo np canal LCI, uma das maiores emissoras de televisão da França, que deveria se fazer um estudo na África sobre o novo coronavírus. As autoridades médicas francesas afirmaram que a pesquisa deveria ser feita na África porque lá "não há máscaras, nem tratamentos, nem aparelhos de reanimação cardiorrespiratória". A exploração racial explicita, sem pudor.
 
Nos Estados Unidos a situação racial não é muito diferente. Na cidade de Chicago a população negra corresponde a 30% da população da cidade, no entanto eles correspondem a 70 % dos casos infectados e também são em maioria em número de mortes. Portadores de condições crônicas como diabetes, doenças cárdicas e asma por conseguinte são vulneráveis. É importante salientar que as condições citadas não são em decorrências de causas genéticas ou herança familiar sim resultado de uma desigualdade social junto a acesso reduzido aos sistemas de saúde.

As questões raciais nos Estados Unidos são tão impactantes que no dia 11 de abril um homem negro que estava abastecendo uma van foi interpelado por um policial, algemado e interrogado até que a esposa da vitima lhe trouxesse seus documentos de identificação. O homem negro era o Doutor Dr. Armen Henderson, ele estava na porta da sua residência e estava abastecendo a van que é de sua propriedade. O médico faz um trabalho voluntário de testagem de COVID em moradores de rua da cidade de Miami e estava abastecendo com materiais. O médico ainda manifestou outra preocupação o policial tocou seu corpo, falou muito próximo de seu rosto sem uso de máscara de proteção desobedecendo as orientações de prevenção. 

E no Brasil?

Antes de mais nada é preciso lembrar que o Brasil é um país com desigualdade racial. Invadido por Europeus que assassinaram milhares de indígenas para a apropriação de suas terras e riquezas.  O êxodo forçado de milhares de homens e mulheres do continente Africano que foram transformados em mercadorias/moeda/objeto. Hoje uma nação herdeira de um comportamento colonial e escravocrata.

Segundo dados do IBGE nota-se que a população preta/parda se encontra em situação de desvantagem em comparação a população branca.
A informalidade no mercado de trabalho está associada, muitas vezes, ao trabalho precário e/ou à falta de acesso a algum tipo de proteção social, que limita o acesso a direitos básicos, como a remuneração pelo salario mínimo e a aposentadoria e esse grupo é composto majoritariamente pela população negra.

Os cargos gerenciais em 2018, 68,6% eram ocupados por brancos e 29,9% ocupados por pretos ou pardos, nos dando informação de onde esta a gestão institucional. 

A representação política em 2018 contou com o seguinte perfil de Deputados federais eleitos: Branca e outras 75,6 %  e Preta ou parda 24,4 %.
A principal função do deputado federal é legislar. Propondo, discutindo e aprovando leis. Aprovar ou não as medidas provisórias, propostas pelo presidente. E a população negra não tem uma ocupação expressiva nesse espaço de poder.

A educação que é um direito fundamental garantido pela constituição e que é uma estratégia que amplia o desenvolvimento social econômico e cultural teve em 2018 a seguinte taxa de analfabetismo para pessoas de 15 anos ou mais de:

Total
Urbano
Rural
Branco
3,9% 

3,1%
11,0% 

Preto ou pardo
9,1%
6,8%
20,7%

A população negra está em desvantagens em vários cenários. Correspondemos 54% da população brasileira. Temos diferentes seguimentos populacionais que igualmente apresentam diferentes níveis de vulnerabilidade. Quilombolas, a população carcerária, os ribeirinhos, a população em situação de rua (que segundo o IPEA registrou e 2010 uma média de 101 mil). Todos tem suas demandas que já foram estudadas, eles próprios são sujeitos de suas histórias e a partir deles que se deve construir estratégias para o enfrentamento do COVID 19. Banheiros com possibilidade de banho para moradores de rua, pias com água e sabão em locais estratégicos , obrigatoriedade das empresas fornecerem materiais de proteção para os trabalhadores das áreas essenciais como os de supermercado e farmácia sao alguns exemplos solicitados pela própria população. 

As primeiras medidas preventivas lançadas publicamente não contemplavam grande parte da população brasileira. O perfil dos suspeitos eram pessoas brancas de classes média que estavam retornando de viagens da Europa. Mesmo sendo uma doença de fácil transmissão as medidas de prevenção foram inicialmente elitizadas. Tivemos um caso emblemático do falecimento de uma empregada doméstica, uma mulher negra moradora da periferia que foi contaminada por sua patroa  que retornou de uma viagem a Europa, reside no Leblon. A patroa teve acesso a todos os recursos possíveis para o tratamento e cura e a empregada não.

Materiais como álcool em gel tem um custo significativo que por conseguinte impacta no orçamento da população de baixa renda.  As medidas de isolamento em lares com poucos cômodos e aglomeração dos residentes, acesso a água nos bolsões de pobreza. Até mesmo imagens nos veículos de comunicação, haviam poucos os corpos negros em propagandas de conscientização. Todo o manejo inicial da COVID por parte do estado foi questionado por representantes das partes afetadas. O coletivo negro Madalena Anastacia por exemplo fez uma campanha nas redes sociais alertando que pessoas pretas também lavam as mãos, pesquisadores pensando no perfil populacional do país demandou enfatizar a higiene com água e sabão e não apenas o álcool em gel visando a redução de custo e o acesso, foi discutido a renda emergencial, profissionais de saúde estão pressionando para que critérios como raça/cor não seja negligenciado no momento do preenchimento dos dados dos suspeitos e confirmados de covid pois dados fidedignos possibilita a construção de politicas públicas diretivas.

A romantização da pobreza não é correto, afirmações como a do então presidente de que pobre mergulha em esgoto e nada acontece é negligenciar e zombar dos danos a corpos negros.

As transformações sociais para a população negra são previsíveis no nosso atual contexto. Ela está em maior parte na informalidade e sujeita a perda imediata das fontes de renda. Instituições educacionais adotaram EAD para manutenção das atividades contudo aquele não tiver acesso a internet de boa velocidade, equipamento eletrônico de uso exclusivo nos horários das atividades não terão como acompanhar. As datas do ENEM estão mantidas e por certo a população negra ficara em desvantagens.

A atenção primária a saúde no Rio de janeiro atravessa forte crise com a gestão municipal que sistematicamente esta fechando e/ou sucateando as unidades de atenção básica com demissões dos integrantes da as equipes de saúde e falta de medicação e material.

Doenças crônicas como hipertensão, diabetes, tuberculose, doenças renais com interferências  acompanhamento regular. Assim o acesso a saúde apesar de universal e gratuito não acontece equidade com um déficit em áreas periféricas. 

A população negra neste momento tem uma ação ineficiente do estado, o assédio da milícia.
Com a proposital falta de olhar do estado Redes de apoio e solidariedade se formaram e se multiplicaram pelo país nas comunidades periférica. Vamos exigir do estado e vamos nos ajudar. Agora mais do que nunca é nós por nós. 

Vamos ter fé.




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