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22 maio 2020

Cultura Negra e a Ideologia do Recalque

        Trata-se de um debate acadêmico de como a cultura negra em toda a sua abrangência sofreu (e sofre) ataques genocidas para sua “diluição” que nada mais é que omitir elementos fundamentais, incluir elementos de outras culturas, no caso a europeia para que ela se torne mais palatável.

     O livro então, traz uma análise crítica a quem faz arte e a quem critica arte. Antropólogos, sociólogos, cineastas, artistas plásticas, músicos, escritores entre outras “autoridades". 

Julgamentos a cultura negra tendo a Europa como referência decai a uma falsa simetria que resulta teorias “animistas” e “fetichistas”.

        Muito se discute nessa escrita a importância de não hierarquizar e comparar visões de mundo diferentes. O céu, o paraíso, o pecado e o inferno dos cristãos com o Ayê e o Orum por exemplo. Uma filosofia não anula a outra e também não se sobrepõe. 

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      É o racismo que faz com que a sociedade omita os valores da civilização africana. Não é admissível para os racistas que haja possibilidade de existência fora da sua esfera de poder e de conhecimento. 

      O racista não é tolo. Ele estereotipa e demoniza, mas usurpa as ideias. O autor fala das obras de artes sequestradas do tempo colonial com valor inestimável e que estão trancadas a setes chaves nos grandes museus do ocidente. 

      Outro fator citado é o trabalho de Carlos Cavalcanti que fala sobre a experiência cubista de Picasso ser inspirado na cultura negra. Se tirados do contexto próprio de significação e comunicação a arte fica esvaziada e vulnerável ao arbítrio mais variados.

 
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      A temática foi abordada no filme Pantera Negra onde o descendente de Wakanda vai a um museu no ocidente para reaver uma peça ritualística e poderosa para o seu povo.
 
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          No Brasil terreiros de candomblé eram rotineiramente invadidos pela polícia que prendiam os participantes e líderes, destruíam a estrutura do território, mas sorrateiramente se apropriavam de esculturas, indumentárias, roupas e objetos sagrados (que até hoje está em poder da polícia)

            A exploração econômica  é aliada da dominação política, cultural e étnica. 

       A mestiçagem cultural foi uma estratégia estatal para eliminação da raça já que a ferramenta jurídica de exploração e destruição do negro foi derrubada com a abolição. Deslegitimar, impedir a formação de uma identidade, desumanizar tornaram-se estratégias para não incluir o negro enquanto cidadão. Sem humanização, sem direitos.  

     A riquíssima visão sagrada do mundo, as formas específicas de comunicação, a dimensão estética peculiar, conhecimentos científicos, da medicina, da matemática, da botânica, o saber filosófico, psicológico e pedagógico todos os valores civilizatórios são recalcados, estereotipados, embranquecidos.

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       O livro destaca o cinema brasileiro e o pavor da diferença, da alteridade. O cinema nacional é aliado a ideologia neocolonial. Uma lista de filmes é apresentado. Cacá Diegues foi criticado por Beatriz Nascimento que se sentiu ofendida como mulher negra e como historiadora dos excessos de estereótipos do filme Xica da Silva.

      Será o cineasta neutro? As lentes das câmeras mostram apenas verdades nos documentários ?

      Um capítulo é dedicado aos obstáculos de uma antropologia negra. Conhecer uma cultura ou um sistema simbólico partindo de outra cultura e de outros sistemas simbólicos. Perspectiva "de fora pra dentro". O uso indiscriminado da palavra “primitivo” para classificar o que é diferente. Resumir “evolução” de uma sociedade a escrita e máquinas e desconsiderar os valores e padrões próprios das diferentes sociedades como a tradição oral por exemplo.

O combate e a tentativa de eliminação da religião negra é a tentativa de impedir o avanço do processo civilizatório negro. Definitivamente a religião de matriz africana não é “ópio do povo”, são comunidades bem estruturadas. 

Explicações sobre as nações que aqui chegaram como por exemplo Nago e Jeje. O culto aos ancestrais como dinâmica tradicional. Sistema educacional. Literatura negro-brasileira d Mestre Didi. Chama a atenção para a Umbanda que ao ser elitizada foi embranquecida com discursos kardecistas.

Ancestralidade não se restringe a uma herança genética, mas sobretudo a um legado sócio cultural e histórico.

Na literatura o autor mostra a potência do conto e da oralidade. A escrita tem suas limitações. A voz, o som, a respiração são formas especificas de transmissão de valores. Comunicação ligada a experiências vividas que marcam o fortalecimento da identidade, do lugar e da função do individuo na sociedade.
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Verifica-se ainda que na contextualização estética, nega-se nas artes plásticas, os seus símbolos e signos a influência na arte europeia. Símbolos litúrgicos são tirados de seus significados para uma apresentação apenas material. Universalização é tirar a carga original, é colonização.

Xango e Exu receberam um destaque. O primeiro proporciona o bem viver comunitário, o equilibro político através da justiça no cumprimento das regras de tradição de valores e o outro é quem garante a ação do orixá, patrono da relação sexual, garantindo a expansão das espécies favorecendo o ciclo vital. Seus símbolos e significados são bem descritos. 

Eu particularmente fiquei com uma dúvida. Quantos Orixás temos?

A música percussiva é o elemento ritual que promove relação entre os membros das comunidades com os ancestrais e os orixás. Uma percussão ritma sincopada que condensam e expressam a dinâmica entre o Orum e o Ayê.

Não está no livro, mas aproveito para declarar: Candomblé do mal ou Candomblé vegano são mentiras criadas propositalmente.


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Um comentário:

  1. "Será que o cineasta é neutro? " Sempre me pergunto por isso quando assisto a obra , a vida de uma personalidade sendo retratada em filmes ou novelas . Claro que não. Existe uma política de se fazer aquilo que vai vender e nem sempre as histórias contadas na íntegra é interessante aos olhos e ao ouvido da maioria das pessoas. Excelente reflexão, Rose. Parabéns!

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