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16 fevereiro 2020

Idéias para adiar o fim do mundo

A leitura do livro veio pela indicação de uma grande amiga Celia Cristo. Esse presente chegou em um momento em que eu vivenciava muita desesperança dentro do meu coração. A atual conjuntura política só vem para massacrar as massa vulnerabilizadas que são o povo preto e a nação indígena.
Com muita vergonha confesso que não conhecia Ailton Krenak. Me envergonho porque ele é porta voz de um debate político que atravessa a existência do mundo. Não sou indiferente, mas cometi essa gafe.
O autor descreve a sensação de pisar na terra do seu algoz. A dor é ancestral, cada um lida com ela de uma forma. 
Ele me chama atenção para datas que podem ser comemorativas para o norte e ser grande tristeza para o sul (genocidado, escravizado e torturado). 
Me recordo que a uns anos atrás passei minhas férias em Chicago nos Estados Unidos e nesse interim chegou o dia 12 de Outubro, na ocasião era feriado e eu pude assistir a grande parada em comemoração do dia de Colombo, comemoração do “descobrimento da américa” o famoso Colombus days. Um desfile de gente branca, grande parte de descendência Italiana, vestindo seus trajes típicos de confrarias, várias bandeiras, um olhar irônico e “superior” para os que os assistiam.  Eu enquanto mulher negra fiquei incomodada, logo fui me informar mais sobre o assunto e para minha felicidade descobri que há um debate bem sério em abolir essa data pois ela é a comemoração do genocídio indígena, dizimação de uma nação, não há nada o que comemorar. Em alguns locais dos Estados Unidos o feriado foi retirado e em outros foi trocado pelo Dia dos Povos indígenas.
Em seu livro Krenak fala da relação dos povos originários com a natureza. Eles são uma coisa só pois tudo é natureza. Isso me fez lembrar que o homem, nesse caso o homem branco eropeu, tem uma relação hierárquica com a natureza e se coloca superior a ela. Por se colocar em posição superior, ele pode subordinar, destruir, manipular, desapropriar. Assim sendo o indígena igual a natureza, o negro  de natureza “selvagem” ambos podem ser manipulados ao bel prazer, pois “bárbaros” que precisam ser “civilizados”
A natureza fala conosco, só precisamos aprender a escutar e a entender o que ela quer nos dizer. A urbanização e privatização do mundo abre espaço para destruição da natureza que é a perpetuação do genocídio. 
Sobram as rugosidades, termo muito usado pelo Geografo Milton Santos, o antigo e novo se misturam na paisagem e contam suas histórias.  
A destruição do planeta nos tira do sério e não nos deixa respirar. Tudo parte de um projeto político que nos transforma em consumidores e não em cidadãos.
Hoje muitos, e eu me incluo, andamos feitos zumbis esperando o fim do mundo pois pelo que parece não sabemos mais quantas gerações o mundo vai aguentar. O que será que vai sobrar para meus sobrinhos netos?
 O processo civilizatório foi destruidor introduziu forçosamente a Bíblia, a escola a estrada, a mineradora...
O autor me fez refletir sobre minha subjetividade pois não somos todos iguais. Ele fala também sobre as formas de resistência. Vamos viver o que somos de subjetivo, vamos nos atrair pelas nossas diferenças. E vamos resistir todos juntos.
Estamos vivendo uma política de estado que planeja devastar, ainda mais, as terras que na verdade são familiares dos povos indígenas, em nome de ambição. Pois não há necessidade de lucrar mais, a riqueza (valores materiais) que existem no mundo já seriam suficientes. Mas a subjetividade do acumulador não pensa dessa forma. 
A destruição do Rio doce me tirou o sono, ainda estou inconsolada. Neste livro aprendo que ele é o avo do povo Krenak, seu nome é Watu. Não deveria ser um “recurso” não deveria ser apropriado. Para o povo Krenak ele ainda esta vivo. O brasileiro médio tem a mentalidade de que o índio deveria participar da exaustão da natureza. O Jose Magalhaes filho, um homem branco evangélico, assumiu um cargo na FUNAI e deu uma declaração que esta nos planejamentos dele que o indígena frequente a escola urbana, o estimulo a miscigenação que para ele é “integração”,  revitalização da área indígena construindo uma fabrica de doce e transformar os povos originários em trabalhadores de fábrica. O mesmo fala isso em rede publica de televisão e não sofre nenhuma penalização. A fala é aceita por muitos da população que acreditam que o mundo não passa de uma mercadoria.
Temos que moldar o nosso olhar para o mundo e coletar ideias para adiar seu fim. Os povos originários escolheram resistir e refletir. 

Eu estou com ele, e você, quais as suas ideias para adiar o fim do mundo?


14 fevereiro 2020

O cabelo de Lelê

O livro conta a história de Lelê, uma menina preta que não gosta de seus cabelos. Lelê se pergunta de onde vem tantos cachinhos pois ela tem dificuldade de manejar o próprio cabelo.







Lelê foi buscar a respostas nos livros, mas sabemos que o cotidiano de toda menina preta envolve o carinho e a atenção de uma mãe, uma tia, uma avó... pra mim essas seriam as primeiras pessoas a quem Lelê perguntaria sobre seus cabelos. Assim as mamães teriam a chance de explicar a Lelê que todos somos diferentes e isso é lindo.
 

No livro Lelê descobre que África é um lugar de amor mas também é local onde os brancos fizeram guerra. 

Lelê descobre a beleza em África, descobre que lá há muitas meninas com cabelo parecido com o dela.

Uma pena que a autora não selecionou e nominou alguns países e etnias para que Lelê descobrisse que lá todo mundo é diferente também, facilitaria a Lelê a criar uma identidade e entender que seus cachinhos bem de longe, lá do outro lado do atlântico. Lelê ama o que vê. 




Eu amo meu crespo e você?


Escito pela Jornalista Valeria Belem, uma mulher branca nascida no Rio de Janeiro. As Ilustrações são de Adriana Mendonça uma mulher branca.



09 fevereiro 2020

Escravidão I

O livro começa com uma frase do Padre Antônio Vieira, seria fofo se no mesmo livro não tivesse a descrição de que o  padre  atribuía o comércio de escravos a um grande milagre de Nossa Senhora do Rosário porque, segundo ele, eram tirados da barbárie e do paganismo na África.

Escrito por Laurentino Gomes, homem branco, privilegiado, descendente de Italiano que chega ao Brasil para substituir a mão de obra cativa. (termo cativo na mesma régua para imigrante italiano e para negros sequestrados e torturados em África e no Atlântico  me causou estranheza).  De família também branca da parte do pai onde teve um abolicionista então o autor reivindica lugar de fala para narrar a escravidão negra.

 Há uma linha do tempo com fatos marcantes no Brasil e no mundo, exemplos: conversão do rei do Congo ao Cristianismo que foi um crime, chegada de Pedro Alvares Cabral a Bahia, me da arrepios só de pensar na matança indígena, Chegada dos primeiros Jesuítas ao Brasil com suas missões, de apagar a história e religiosidade existente, Londres devastada por um incêndio... 


Francisco Felix de Souza é colocado como um dos personagens “mais extraordinário do Brasil”. O talento? Foi um dos maiores escravocratas do Brasil.  Sua fortuna que seria hoje equivalente a 120 milhões de dólares... ELE VENDIA GENTE a base de tortura!!!.





Lula foi na porta dos sem retorno, Lula vestiu-se de rei Africano, o BNDES liberava fartas quantias de dinheiro pra angola, o Brasileiro deixou um vácuo nos negócios que foram ocupados pelos Chineses em Angola, Lula não pagou indenização a embaixada de Gana, 14 anos de governo petista, lava jato e o Michel Temer que fechou a torneira... Eu lendo com a voz de Willian Bonner. 


Após a leitura tive a sensação de estar lendo um manual de coach da escravidão pois foi extenso e detalhado a quantidade de datas , números, valores, rotas e sem faltar adjetivos positivos ao sucesso da barbárie. Eu já estava esperando: “a escravidão negra era a satart up da época, enquanto uns dormiam outros acordavam as 5 da manhã com suas Naus e persistiam a cada erro. Era só schedular um brainstorm para estimular o team building na cultura organizacional deles, aproveitando o know-how do CEO, agregar valor ao business plan". “Sucesso” Europeu garantido.

Se detalha mais a revolta liderada por Spartacus do que a Revolta dos Malês. Para uma epistemologia pretensa a ser do Sul, acho complicado.


Cita problemas da África de hoje como epidemias, tragédia humanitárias, fome e fecha o raciocínio com a imigração do Africano para Europa (terra da salvação?) como opção de vida melhor. Fiquei desconfortável com a não racializaçao do problema, e a branquidade nisso tudo? e ausência do debate sobre desigualdade, capitalismo ja no embalo dessa parte do texto.



O Brasil “recebeu” 5 milhões de Africano...
 
Recebeu = sequestrou, manteve em custódia a base de tortura e obrigou a trabalhar numa dinâmica de castigo físico e psicológico. Estavam fora de seu território, não podiam professar sua fé e falar seus idiomas, privado de família e amigos. Não, não era o Enzo que trancou a faculdade de design na PUC pra curtir seu ano sabático e foi RECEBDO pela sua tia rica que tem uma escola de Yoga na Tailândia 


O autor cita outros tipos de escravidão que é bem interessante, mas  usa a mesma régua para a escravidão negra realizada pelos Europeus.  Cita todo tempo que todas as raças foram escravizadas mas contextualiza fora timing. 

Repete, exemplifica, detalha, relembra... do papel do negro na escravidão. Cita os reis, as rotas os valores, nomes... mas não contextualiza de imediato. Jogo estranho.

Boko Haram é citado, células nazistas pelo mundo, grupos de supremacia branca não.

O uso da palavra descobrimento no lugar de invasão.

Em a Crítica da Razão Negra Achile Mbembe fala que dos séculos XV ao XIX homens e mulheres originários de África foram transformados em homem-objeto, homem-mercadoria, homem-moeda. Deixavam de ter nome e língua, aprisionados no calabouço para suprir a ambição do branco Europeu. A servidão foi assim racializada. O negro foi o elemento central na criação da plantation que foi uma das formas mais eficazes de acumulação de riqueza e um local de disciplina onde era autorizado a destruição do corpo negro. O racismo passa ser a tecnologia de opressão. Através da racialização sabe-se quais corpos podem ser hostilizados da forma mais bárbara possível. E foi tudo muito bem pensado, não foram experimentos aleatórios. A França após perder para Prússia em 1870 usou a colonização como a nova era de virilidade, a colônia seria o lugar de exaltação de sua potência e investiu-se pesado em uma pedagogia colonial era ensinado desde a infância que os colonos não eram cruéis e sim protetores pois os negros eram débeis.



O europeu DESABROCHOU apenas no final do século XVIII que sequestrar e torturar gente por dinheiro era errado. O termo desabrochar, achei conceito.



Pedro Claver o único santo católico fruto da escravidão passou 40 anos aguardando a chegada dos navios negreiros para descer aos porões para cuidar dos sequestrados.  Michel Foucault em Microfísica do poder fala que cuidar de doente não tinha muito haver com doente, as pessoas os faziam para buscar redenção. O padre devia cuidar dos necessitados recém escravizados e depois comer comida feita por escravizados, dormir no quentinho com lareira cheio de lenhas cortados por escravizados, tomar banho com água carregada pelos escravizados... 

O romântico relato do homem negro que fez o exame de DNA e vai conhecer os eus em Africa, uma vez lá pergunta ao Rei Africano como ele foi parar no Brasil. Senti falta de relatos tão emotivos de negros fazendo o mesmo em Europa.

África perdeu 22 milhões de habitantes em três séculos, mas o historiador John Thornton observou que o desbalanceamento entre o número de homens e mulheres foi compensado pela tradição africana de poligamia, a taxa de natalidade se manteve elevada, mesmo durante os períodos mais intensos de tráfico negreiro, permitindo que o contingente populacional fosse reposto gradativamente. Eu estava esperando o autor soltar um: Eles que lutem! Ta tudo de boa.

Em 2017 Emmanuel Macron afirmou que África tem problema civilizacional e criticou taxa de 7 a 8 filhos por mulher. O branco jogando a culpa pra o Africano

Tentaram por uma estátua de 4 metros da Rainha Catarina de Bragança no bairro do Queens em Nova Iorque e foram impedidos pelo movimento negro e movimento social. Catarina era escravocrata e homenageá-la em um bairro negro seria um despautério.

Rainha Jinga e seus feitos. Ela é colocada como uma mulher voluntariosa e arrematam que no final da vida foi uma pacífica e devota católica. No capítulo seguinte e dito que Jinga infernizava os Portugueses (ela negociava e resistia). 

Beatriz do Nascimento já falava que o Quilombo se forma da necessidade humana de se organizar de uma forma específica e não da determinada pelo colonizador. Quilombo é uma estrutura social, e já estabeleciam suas lideranças que poderia ser o curandeiro, uma parteira. Fuga para ela está longe de ser movido pela incapacidade de lutar é antes de mais nada, decorrência de todo um processo de reorganização e contestação da ordem estabelecida. Dentro de um regime de escravidão, o Quilombo e seus correlatos são tentativas vitoriosas de reação ideológica, social, político-militar sem nenhum romantismo irresponsável. No capítulo sobre quilombo o autor até fala sobre isso, mas logo no início do livro ele define Quilombo como “redutos de escravos africanos fugitivos”.


Luiz Mott um homem branco gay usa a orientação sexual na tentativa descontruir a guerrialidade e força de Zumbi e o descreve como gay  por ser possuidor de “temperamento suave e habilidades artísticas”. Eles não desistem.

As mulheres do povo banto tinham o corpo curvilíneo e de volume generosos e o autor manda observar o CARNAVAL DO RJ pra conferir. Nessa hora eu chorei de verdade. Olha a referência sexualizada, que falta empatia.

A sensação que me da é que se tenta passar que era tão lucrativo, que era praticamente inevitável e irresistível não sequestrar, matar, torturar, mutilar, queimar por dinheiro Até tubarões que foram o último jazido de muitos corpos de nossos ancestrais iriam sentir falta.

Danos físicos, psicológicos, crianças e grávidas torturada, mães assassinando seus filhos para protege-los da escravidão nos moldes do branco europeu, suicídios, homens negros mutilados, destruição da família e vínculos como tecnologia de poder, civilizações destruídas, genocídio indígena em toda a américa... Só quem tem banzo sabe.

Não sou historiadora e não refuto nenhum dado histórico do livro, falo do meu lugar de mulher negra leitora e a narrativa me incomodou.  

Leitura cansativa.. Não recomendo para quem esta iniciando os estudos em relação étnicos raciais para auto conhecimento.  Deve ser bom para trabalho escolar porque tem a coletânea de muitos dados e sao fáceis de localizar no livro.